Dr. Rubem A. Mariano
Psicólogo - CRP 08/14994
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Resumo: O presente artigo
explora o conceito de gestão do tempo para além de uma mera técnica de
otimização, abordando-o como uma forma de autogestão baseada na construção da
realidade pelo cérebro humano. A partir de uma palestra realizada no Sindicato
dos Engenheiros no Estado do Paraná (SENGE),na cidade de Maringá, este trabalho
integra conceitos de neurociência, filosofia e psicologia, propondo que a
verdadeira gestão do tempo é o gerenciamento da energia, da atenção e dos
estados mentais. Ao compreender como o cérebro funciona, o profissional, em
particular o engenheiro, pode criar um ambiente propício ao foco e à
produtividade, transformando a "gestão do tempo" em uma habilidade
interna de moldar a própria experiência pessoal e profissional.
Palavras-chave: Gestão do
tempo; Autogestão; Neurociência; Engenharia.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo, adaptado de uma
palestra proferida no Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (SENGE) com
o tema "Gestão do tempo: como executá-la na vida pessoal e
profissional", propõe uma abordagem inovadora sobre o tema.
Tradicionalmente, a gestão do tempo é vista como a aplicação de ferramentas e
metodologias para organizar tarefas e otimizar agendas. No entanto, esta
perspectiva é limitada. A proposta aqui é desmistificar o tempo como uma
entidade externa e imutável, e, em vez disso, encará-lo como uma construção
subjetiva do ser humano. A partir dessa premissa, argumenta-se que a
"gestão do tempo" é, em sua essência, uma forma de autogestão.
A reflexão inicial sobre a
natureza humana, a percepção da realidade e a própria essência do tempo, busca
estabelecer um alicerce teórico para a compreensão de que gerir o tempo é gerir
a si mesmo. Este artigo explora a visão de pensadores e neurocientistas, como
Miguel Nicolelis, para sustentar a tese de que o cérebro é o construtor da
nossa realidade. Com base nisso, são apresentadas estratégias práticas,
fundamentadas na neurociência, que permitem a um profissional, especialmente um
engenheiro, otimizar sua produtividade e bem-estar, não pelo controle de
minutos, mas pela gestão de sua própria energia e atenção.
2 O SER HUMANO COMO CONSTRUTOR
DA REALIDADE
A forma como percebemos a
realidade é profundamente pessoal e subjetiva. A parábola de "A Águia e a
Galinha", utilizada por Leonardo Boff em seu livro homônimo, ilustra essa
ideia, destacando que "todo ponto de vista é a vista de um ponto"
(BOFF, 1997, p. 73). A nossa perspectiva individual, moldada por experiências e
contextos, define como enxergamos o mundo e, consequentemente, a nossa
experiência do tempo. A pergunta "o que você vê (num dado espaço-tempo) é
igual ao que o outro vê em (um outro dado espaço-tempo)?" demonstra que
não existe uma realidade universalmente idêntica.
Essa visão é corroborada pela
neurociência. O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, em sua obra "O
Verdadeiro Criador de Tudo" (NICOLELIS, 2011), defende que o cérebro não é
um receptor passivo de estímulos, mas sim um construtor ativo da realidade
humana. Nossa percepção não é uma representação literal do mundo exterior, mas
uma simulação interna elaborada pelo cérebro a partir de suas interações com o
ambiente. Portanto, a realidade que vivenciamos é uma criação cerebral.
Nesse contexto, o tempo, assim
como a realidade, não é uma entidade única. Filósofos e cientistas ao longo da
história trouxeram diferentes definições para o conceito: Aristóteles o via
como uma medida de movimento; para Santo Agostinho, era uma experiência
subjetiva na mente; Newton o considerava uma entidade absoluta; Kant, uma forma
de intuição; e Einstein, uma dimensão relativa, afetada pela velocidade e pela
gravidade. A síntese é clara: o tempo não é uma entidade externa, mas uma
concepção variável e subjetiva.
3 A GESTÃO DO TEMPO COMO
AUTOGESTÃO DA REALIDADE
Se o ser humano constrói sua
própria realidade (NICOLELIS, 2011) e o tempo é uma experiência subjetiva, a gestão
do tempo não pode ser a de um recurso externo imutável. Em vez disso, a
verdadeira gestão do tempo é o ato de gerenciar a nossa própria percepção e
experiência subjetiva da realidade. Trata-se de um processo interno de
autogestão, que se manifesta de duas maneiras principais:
- Gestão da Perspectiva: Como indicado pela
fábula de Boff e a dinâmica da percepção, a nossa visão do tempo é
pessoal. Gerir o tempo, então, é moldar a perspectiva a partir da qual o
enxergamos. Isso envolve o desenvolvimento da autoconsciência e da
flexibilidade mental.
- Gestão da Consciência: A prática de
mindfulness, ou atenção plena, nos lembra que a nossa experiência do tempo
é profundamente interna. Gerenciar o tempo é, antes de mais nada, gerir o
nosso foco e a nossa consciência, permitindo que o tempo seja gasto de
forma intencional e alinhada aos nossos propósitos.
Portanto, a frase "gestão do
tempo" assume um novo e profundo significado. Ela deixa de ser uma técnica
para otimizar minutos e horas, e passa a ser uma forma de criar uma realidade
onde nosso tempo é gasto de maneira alinhada aos nossos valores e objetivos. É
a habilidade de sermos os "engenheiros da nossa própria experiência".
4 ESTRATÉGIAS PRÁTICAS PARA O
PROFISSIONAL ENGENHEIRO
Para um profissional de
engenharia, a aplicação desses conceitos se traduz em um conjunto de práticas
fundamentadas na neurociência. Não se trata de controlar o tempo, mas de
gerenciar a energia, a atenção e os estados mentais, tornando-se o engenheiro do
próprio cérebro.
4.1 Gerenciar a Energia e o
Cronotipo O cérebro opera em ciclos circadianos que regulam a energia e o
foco. Identificar seus "picos de performance" (se você é uma
"cotovia" matutina ou uma "coruja" noturna) é crucial.
Tarefas que exigem foco profundo (cálculos complexos, design de projetos) devem
ser agendadas para o período de maior energia cerebral. Forçar o foco em um
momento de baixa energia é ineficaz e aumenta a probabilidade de erros.
4.2 Proteger a Atenção e Criar
um "Ambiente de Foco" O cérebro leva cerca de 23 minutos para
recuperar o foco total após uma interrupção. As constantes distrações, como
notificações e e-mails, forçam uma "multitarefa ilusória" que esgota
a energia mental. Técnicas como a Pomodoro (25 minutos de foco total seguidos
por uma pausa de 5 minutos) são eficazes para combater essa sobrecarga. Ao
minimizar distrações, o cérebro pode entrar em um estado de "fluxo",
onde a produtividade e a criatividade aumentam exponencialmente.
4.3 Segmentar Tarefas
Complexas Grandes projetos podem ser avassaladores, gerando ansiedade e
procrastinação. O cérebro adora recompensas, liberando dopamina, o
neurotransmissor da motivação, ao completar tarefas. Dividir projetos complexos
em pequenas subtarefas claras e alcançáveis cria um ciclo de feedback positivo,
incentivando a continuidade e combatendo a sensação de sobrecarga.
4.4 Priorizar o Descanso O
descanso e o lazer não são luxos. O cérebro consolida informações e memórias de
curto prazo em longo prazo durante o sono. A falta de descanso afeta
diretamente a função executiva, a memória e a capacidade de resolver problemas.
Um cérebro descansado é um cérebro mais produtivo e criativo.
4.5 Desenvolver a
Flexibilidade Cognitiva A capacidade de se adaptar a imprevistos é mais
valiosa do que um cronograma rígido. A rigidez mental está ligada ao estresse,
que ativa a amígdala. A flexibilidade cognitiva, por outro lado, permite que o
cérebro use mais o córtex pré-frontal, facilitando a tomada de decisões
estratégicas em situações de mudança.
5 CONCLUSÃO
A verdadeira gestão do tempo é,
fundamentalmente, uma forma de autogestão. Conforme a visão de Miguel
Nicolelis, o cérebro humano é o construtor ativo da nossa realidade e da
experiência subjetiva do tempo. Para um profissional, isso se traduz na necessidade
de gerenciar não o relógio, mas a si mesmo. Isso implica priorizar o
autoconhecimento, a atenção plena e o descanso para otimizar a energia e o
foco.
A "gestão do tempo"
deixa de ser uma técnica externa para se tornar uma habilidade interna: a
capacidade de ser o engenheiro e arquiteto de sua própria experiência pessoal e
profissional, moldando o tempo de forma intencional e alinhada com seus
propósitos.
REFERÊNCIAS
BOFF, Leonardo. A Águia e a
Galinha. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.
FREITAS, Nelson. O Tempo.
[Áudio]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=M5G87V-P8b8. Acesso em: 30
ago. 2025.
MONTENEGRO, Oswaldo. A Lista.
[Música]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=53zUaT1-K4A. Acesso em: 30
ago. 2025.
NICOLELIS, Miguel. O Verdadeiro Criador de Tudo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
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